Um alienígena para maiores

A edição de setembro de 1996 de uma revista americana de grande circulação anunciava logo na capa: “O Alien — primeira fotografia autêntica do mundo“. Eram nada menos que “três imagens extraordinárias que podem bem ser os registros mais importantes da história da fotografia”, anunciava o editor. Mais de uma década depois, as imagens continuam sendo as primeiras encontradas na rede por aqueles que buscam por “fotos autênticas de extraterrestres”.

De onde teria vindo um flagrante tão importante? Havia toda uma história de aventuras e perigos por trás das três imagens.

“As fotografias pertenciam à filha de um cientista alemão que fugiu para os EUA ao fim da Segunda Guerra Mundial. Aqui o cientista trabalhou com Einstein e Oppenheimer e também se envolveu com pesquisas ultra-secretas do governo, incluindo o infame Experimento Filadélfia e a investigação da queda da misteriosa espaçonave em Roswell, Novo México, no fim da década de 1940.

Anos depois, a mulher disse, seu pai a presenteou com vários quadros de um filme, instruindo-a a mantê-los guardados, deixando claro que simplesmente possuir o filme poderia colocar sua vida em perigo. Ainda assim o filme, ele assegurou, era autêntico e provaria além de qualquer possibilidade de negação o encobrimento governamental dos visitantes alienígenas na Terra. Ela saberia quando seria o momento certo de revelar as imagens ao mundo.

O nome da fonte não será revelado. Seu bem-estar é em parte responsável por esta decisão. ‘Eu respeito sua privacidade e simpatizo com suas preocupações por sua própria segurança, sem qualquer dúvida de que as fotos sejam genuínas’, disse o editor. ‘Também não duvido que a agora que as imagens foram publicadas, o governo insista que são apenas outra fraude”.

Em verdade, o governo não precisou insistir em nada. O que não contamos até agora é que o editor era Bob Guccione, e a revista era a Penthouse, uma publicação mais conhecida por revelar imagens eróticas de mulheres, e não cadáveres de extraterrestres.

As imagens haviam circulado originalmente um ano antes em um tablóide de Hong Kong, logo após o lançamento das imagens da “Autópsia Alien” de Ray Santilli, e já estavam causando certo burburinho nos bastidores da ufologia. Para alguns, este extraterrestre parecia muito mais real do que o de Santilli. No mínimo, era colorido. Seria real?

Resulta que é real, tão real que pode ser visto por qualquer um que viaje até Roswell e visite o “Museu OVNI” da cidade. O extraterrestre é um boneco em exibição:

Note como a maca em que o boneco é exibido é idêntica às imagens publicadas pela Penthouse como autênticas. Para não falar do próprio extraterrestre, ou melhor, boneco de extraterrestre.

Não é, contudo, qualquer boneco. É originalmente uma criação para o filme “O Caso Roswell” (1994), de autoria do profissional de efeitos especiais, Steve Johnson, que trabalharia ainda em “Homem-Aranha 2″ e na refilmagem de “Guerra dos Mundos” de Spielberg.

Quase um ano antes das imagens serem publicadas em Penthouse, já haviam sido desmentidas pelos produtores do filme:

CNI News, 12 de outubro de 1995 — Paul Davids, produtor-executivo e co-autor do filme para a TV do canal Showtime, “O Caso Roswell”, diz que está 100% certo de que o chamado “alien de Hong Kong” é um boneco feito para seu filme. Ele diz: “[Desejo] informar a todos que este “alien” é definitivamente um de quatro bonecos criados para nosso filme. Depois da produção, foi emprestado ao Museu OVNI de Roswell. Lá ele está em exibição ao público, exatamente nessa maca, onde qualquer um pode visitá-lo e tirar fotos. Nunca pretendemos que se tornasse objeto deste tipo de fraude. Por favor, notem que comparei o corpo em todos seus detalhes às dezenas de fotos que possuo desse boneco em particular. Estou 100% certo, sem chance de erro. Cada detalhe dos ferimentos é idêntico. Aparentemente alguém usou uma caneta ou um programa computadorizado para cobrir a área genital e adicionar cores falsas. Fico muito desapontado em ver isto sendo apresentado ao público insuspeito, tanto na imprensa como na internet, como algo verdadeiro, quando decididamente não o é”.

Nada disso impediu Bob Guccione de publicar as imagens, completas com a história da filha do cientista alemão, que deveria permanecer anônima. Boatos deram conta de que o editor teria pago até U$200.000 pelas imagens, o que Guccione posteriormente negou. Tendo ou não pago pelas imagens, enganando ou sendo enganado, e apesar das imagens terem sido esclarecidas quase um ano antes da publicação, o renovado interesse levou Guccione a vários programas de TV, onde deu sua cartada final.

Para ele, as imagens que publicou já existiam muito antes do filme sobre Roswell. Isto é, os bonecos do filme teriam sido criados a partir das fotos, autênticas, e não o contrário. Que as imagens só tivessem vindo à tona depois do lançamento do filme, e mesmo depois que o boneco fosse doado ao Museu de Roswell, não pareceu incomodar tal explicação muito duvidosa.

Várias outras imagens originais do próprio filme “O Caso Roswell” circulam pela rede como autênticas — neste caso, nem mesmo vieram do Museu de Roswell, e sim diretamente do filme:

Abaixo, imagens de um dos outros bonecos produzidos por Johnson — idêntico, mas com “ferimentos” levemente diferentes — parte de uma exposição no Japão:

Neste caso apenas o editor de uma revista erótica — e centenas de autores de páginas pela rede — foram, ou parecem ter sido, enganados. Ufólogos descobriram a fraude rapidamente.

Veremos nas próximas fotografias analisadas como esta foi uma exceção.