Desmistificando a "enxurrada de UFOs" na virada do ano

Poucos minutos antes de virada do ano, partes do foguete chinês Longa Marcha 3A em órbita há mais de doze anos reentraram na atmosfera sobre os estados brasileiros do Mato Grosso do Sul e Paraná. Foi uma visão espetacular, com centenas, talvez milhares de testemunhas — que aguardavam os fogos de artifício — e pelo menos três fotografias e mesmo um vídeo.
Nicholas Johnson, cientista-chefe do Orbital Debris Program Office, Johnson Space Center, NASA, confirmou a identificação por email a este autor no dia 6 de janeiro:

“O estágio do [fooguete lançador] Longa Marcha 3A reentrou às 0143 GMT em 1 de janeiro [11:43 de 31 de dezembro, horário local de Brasília]. Quaisquer bolas de fogo devem ter sido observadas pouco depois”.

William Ailor, diretor do Center for Orbital and Reentry Debris Studies (CORDS) também confirmou a identificação via email pouco depois:

“Você relatou uma reentrada aparente na noite de 31 de dezembro de 2006, aproximadamente às 11:45 da noite no horário local ao sul do Brasil. Baseado nas informações do website CORDS, a única reentrada durante este período foi de fato do corpo do foguete Longa Marcha 3A. O horário previsto da reentrada do website CORDS era 01 JAN 2007 @ 01:44 UTC +/- 30 minutos, ou 31 DEZ 2006 @ 11:44 pm +/- 30 minutos no horário local. Considerando sua localização, o rastreamento em terra do corpo do foguete cruza sua localização aproximada. Registros adicionais de uma observação do corpo do foguete Longa Marcha 3A foram encontrados”.

Identificação
Diferente das reentradas sobre o nordeste há um par de anos, desta vez a identificação preliminar foi muito rápida, feita em questão de horas. Seguindo os relatos divulgados pelos veículos de notícias, o ufólogo Milton Aloísio do Grupo de Estudos de OVNIs pôde indicar em alguns minutos, consultando o website CORDS, que se tratava provavelmente da reentrada do Longa Marcha 3A.
Apenas procurei, dentro dos meios ao meu alcançe, encontrar, ANTES DE TUDO, uma explicação racional e técnica para o fenômeno, entre aquelas catalogadas pelo conhecimento humano. Os dados, devidamente confrontados, não deixavam dúvidas. Qualquer pessoa, com interesse unicamente na verdade, chegaria à mesma conclusão“, explicou Aloísio.
O grupo de astronomia amadora de Dourados, MS, Próxima Centauri também identificou de forma rápida e correta a reentrada, e conseguiu se fazer ouvir pela mídia local. O grupo coletou uma série de relatos, e continua acumulando evidências e averiguando o evento. Prometem publicar uma nota em breve com mais detalhes.
“Enxurrada de UFOs”
A revista UFO se localiza em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, um dos estados sobre o qual a espetacular reentrada pôde ser vista. Ainda que não pudesse tê-lo visto, o foguete estava sobre suas cabeças quando iniciou sua reentrada. Natural que a mídia local consultasse então seu editor, Ademar Gevaerd, mas o resultado dificilmente seria mais desastroso.

Gevaerd, que pesquisa a aparições de OVNIs há mais de 25 anos, diz que tudo leva a crer se tratar mesmo de um objeto voador não identificado. Ele baseia sua afirmação em argumentos. O objeto percorreu uma trajetória retilínea e não em queda; estava a uma altura abaixo das núvens em vôo contínuo. “Acredito que não foi apenas um UFO mas uma ‘enxurrada’ deles, em vários pontos e ao mesmo tempo.
O editor da única revista brasileira de Ufologia e com sede em Campo Grande (MS), diz que na região Sul do Estado é grande a incidência destes UFOs. “Há três pontos principais. Um deles é próximo a Capital; outro na região da Vila Vargas. Entre Dourados e Ponta Porã tem outro local, onde a visibilidade é boa. Lá também estes UFOs são frequentemente avistados“, relata.
[O Progresso]

A lamentável forma como a publicação tratou as reentradas sobre o nordeste no ano de 2004 desafortunadamente não ensinou nada ao ufólogo. Posteriormente o mesmo mencionaria que “alguns ufólogos” teriam sugerido que fosse a reentrada do Longa Marcha, mas que haveria inúmeras questões em aberto indicando que o evento não se resumiu a isto. Exatamente como em 2004, defende-se que OVNIs reais teriam acompanhado a queda de um foguete. No mesmo local, com a mesma trajetória, no mesmo horário. É novamente a vontade de estudar, acreditar e talvez vender discos voadores.
As discrepâncias citadas como argumentos contrários à identificação de pelo menos parte do evento como a reentrada do foguete seriam os relatos de que teria passado abaixo das nuvens, e a suposta massa do satélite Shi-Jian (sic), de apenas 400 Kg. Com relação aos relatos, é preciso considerar antes de mais nada que todo testemunho pode conter imprecisões. Das dezenas de relatos do evento, por exemplo, os horários indicados variavam em quase uma hora. Uma vez que evidências seguras permitiram determinar com precisão o horário do evento, pode-se em retrospecto verificar que apesar das imprecisões, os relatos têm certa coerência mesmo neste ponto. É esperado que relatos contenham imprecisões. Não existe testemunha perfeita. Dada a grande altitude e luminosidade da reentrada, testemunhas podem ter estimado distâncias e tamanhos aparentes de forma incorreta. Seria preciso averiguar exatamente quais relatos falam de fragmentos abaixo das nuvens, em que direção, e quais os tipos de nuvens envolvidas, para uma estimativa de altitude. Mais do que isso, é possível que partes do foguete tenham mesmo chegado ao solo. Principalmente porque não era um satélite Shi-Jian de 400 Kg, como veremos.
Confusões
O CORDS, com suas previsões de reentradas abertamente disponíveis, é uma fonte valiosa que foi felizmente bem aproveitada aqui — embora não por Gevaerd. Mas as previsões de reentrada não são absolutamente seguras, uma vez que envolvem algumas variáveis que não podem ser previstas com precisão suficiente, como a atmosfera terrestre. A reentrada do Longa Marcha na virada do ano foi um exemplo disto.
O CORDS previu inicialmente a reentrada do Longa Marcha sobre a Ásia, em um horário consideravelmente anterior à reentrada sobre o Brasil. Não seria muito provável que o foguete começasse a reentrar na atmosfera sobre o Himalaia e criasse um rastro de fogo até o Mato Grosso do Sul, e se este fosse o caso, deveríamos esperar que muitos de nossos vizinhos andinos também tivessem visto o evento. Foi apenas considerando a proximidade de horário e órbitas posteriores do foguete que se poderia sugerir a identificação. E, como Johnson notou, e o CORDS posteriormente corrigiu, foi de fato o que ocorreu. A reentrada teve início sobre o Brasil, não sobre a Ásia:


No diagrama acima, a linha azul e amarela indica a órbita do foguete, da esquerda para a direita. O centro do círculo laranja marca o ponto de início da reentrada, e o círculo laranja delimita o horizonte do foguete no momento. Isto significa que toda a área dentro do círculo laranja poderia ver a reentrada, caso as condições atmosféricas fossem apropriadas, e também que quaisquer fragmentos que tenham passado abaixo das nuvens e chegado ao chão também devem estar na metade direita do círculo.
Outra fonte de confusão foi a identificação do objeto rastreado como SJ-4, ou Shi-Jian 4. Este é o nome da missão, do satélite de pesquisas lançado em órbita, que tem mesmo apenas 400 Kg. Mas não foi ele que reentrou sobre o Brasil, tampouco o satélite Kua-Fu, também lançado na mesma missão. O que reentrou foi o corpo do foguete Londa Marcha 3A, com quase três toneladas de massa. Não é surpresa que a reentrada tenha sido tão sensacional.
Adendo
Espero que a revista UFO não repita o que fez em 2004, e copie informações divulgadas neste blog em sua publicação erroneamente como vindas de um “site da NASA”, ou mesmo como parecem dizer agora, um site da agência espacial européia. As confirmações da NASA e do CORDS foram enviadas, como da vez anterior, como respostas via email a questionamentos diretos feitos por este autor, que as divulga abertamente. Podem mesmo omitir os créditos, mas inventar fontes já é tão absurdo quanto discos voadores que teimam em acompanhar toda reentrada de lixo espacial sobre nosso país.

0 comentário em “Desmistificando a "enxurrada de UFOs" na virada do ano

  1. Hallo, Mori!
    Olha só o que a UFO deste mês traz:
    “Março 2007
    UFO 131
    Rara coincidência entre reentrada de lixo espacial e casos ufológicos na virada do ano
    O réveillon passado foi provavelmente um dos mais movimentados para a Ufologia nos últimos anos – pelo menos nos estados de Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além do vizinho Paraguai. É que entre 23h10 e 23h50, horário local do MS, inúmeras observações de objetos voadores não identificados foram registradas em dezenas de cidades, tendo como centro dos avistamentos, aparentemente, o município de Dourados, no sul do estado. A Revista UFO também recebeu uma espantosa quantidade de relatos provenientes de áreas muitos distantes, como localidades no Mato Grosso, a mais de 1.000 km de Dourados, além de cidades do oeste de São Paulo, situadas entre 600 e 750 km do centro dos fenômenos. Até mesmo de Florianópolis e Porto Alegre chegaram e-mails de testemunhas dos avistamentos.”

  2. eu tbm acredito ser a reentrada de lixo espacial mas ainda tem alguns detalhes que me deixam grilado.
    um objeto em reentrada fica incandecente até atingir o solo ou só quando passa pela ionosfera?
    “Isto significa que toda a área dentro do círculo laranja poderia ver a reentrada, caso as condições atmosféricas fossem apropriadas…”. dos relatos que li 90% afirmam que a noite estava nublada. Neste ponto (pra mim) é dificil desconfiar da veracidade da informaçao porque uma coisa é vc perguntar pra uma pessoa que viu o evento, outra coisa é 100 de 100 pessoas que estavam presentes dizer a mesma coisa.
    outro lance.
    como um obejeto iria tomar uma direçao “retilinea” no ceu por baixo das nuvens?. a aceleraçao continua da gravidade (9,8m/s²) descreveria uma outra tajetoria, nao é?
    Bom…
    o que me lembro de ter lido e achado estranho é o que está aí. Se me lembrar de mais algo, torno a postar.
    lembrando que nao acredito nem na sua teoria, nem na teoria do ufologo da UFO magazine.
    P.S.: Ceticismo exagerado é igual a fé cega! Em nada se difere. Os sintomas sao os mesmos.

  3. estava na cidade de ivaté, paraná, quando foi visto no céu desta pequena cidade, três luzes. Uma grande e duas pequenas, que ao atingir quase a cidade, elas se juntaram numa só. Timha um cor azulada florescente, e na frente tipo hum bico grande , más a luz que era a calda, azulada não deixava rastro nem um. se era um foguete porquê as duas luzes pequenas se juntaram atrás da luz grande? Faltavam exatamente cinco minutos para a passagem de ano. obrigado.

  4. Bom … sou muito interessada nesses assuntos , dos quais não duvido serem verdade. Por isso estou falando em minha feira de ciencia sobre extraterrestre e gostaria da colaboração de vocês … me mando material se possivel …

  5. Eu moro em ivaté e eu vi, não só eu como muitas pessoas que estavam aguardando a virada do ano, faltava poucos segundos estavamos olhando para o ceu quando passo aqueles 3 luzes brilhantes com calda… fiquei até assustado quando vi…

  6. eu vi na mesma data mas eram tres bolas e foi bem na hora da virada do ano nós até achamos que era queima de fogos mas estava muito auto

  7. Ola, Estou aqui para confirmar, Moro EmUmuaram-pr, Vizinhos dos colegas de ivate ai acima, Tambem vi, Eu tinha apenas 10 anos, Parecia Baixo, E grande, Fiquei Assustado na epoca, Hoje pesquiso sobre isso, E nao acredito que seja lixo espacial, Eu lembro de 3 luzes, Uma grande 2 pequenas, As quais pareciam se movimentar simetricamente, Entao Segue meu Email para podermos Conversar leonardojunior-891@hotmail.com

  8. Olá, também confirmando aqui mais um que presenciou o fato, mas ao contrário do pessoal mais maluco ai que vem parar nesta pagina quase esquecida, eu acredito que foi mesmo o foguete chinês, pela altura, velocidade mais amena e pelo sentido dos objetos (ele ia se desfazendo) faz muito sentido, e até hoje em dia estes casos sempre voltam a se repetir em algum outro lugar do país. Ps: Foi muito legal.

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